2025-05-07
Palavras chave
europa montanha picosHá quem defenda que Portugal, à semelhança de Espanha, possui níveis de biodiversidade superiores aos dos países mais desenvolvidos da Europa. Tendo em conta a era de industrialização que se vive nos países europeus, deduzimos que o atraso de desenvolvimento em Portugal associado ao clima aumentou essa riqueza biológica, mais desenvolvida que nos países que progrediram com uma industrialização maior e mais severa para com o meio ambiente. (1) De certo modo, esta ilacção traz benefícios, na medida em que se torna possível promover um desenvolvimento que não traga consequências nefastas para o meio ambiente. O mal que podemos observar na realidade alheia, poderá servir de garantia para que não cometamos o mesmo erro.
O que é necessário é que o património biológico que, a ser assim, terá benegiciado por um menor crescimento industrial, não venha sofra com as medidas que procuram, agora, acelerar o nosso processo de desenvolvimento. Os tempos e as tecnologias são outras, bem assim como o conhecimento e a partilha de informação. Também a responsabilidade assumida no seio da União Europeia é uma garantia que poderá obrigar a uma reflexão mais apurada sobre o que possa pôr em causa muitos dos valores que devem ser preservados, sob pena de podermos sofrer sanções perante a ausência desse cuidado.
Reconhecemos que uma coisa é o que está escrito, outra bem diferente é a capacidade de intervenção cívica, nomeadamente, das Associações, cada vez em situações mais vulneráveis face às dificuldades sócio-económicas, à emigração da população jovem, entre outros, o que torna a participação voluntária no movimento associativo mais difícil.
Existem, ainda, situações incompreensivas por falta de regras, claras e anunciadas, e falta de vigilância, em parte, causada pela diversidade geográfica, que tem ultrapassado as Áreas Protegidas. Aqui nos dirigimos, por exemplo, ao abuso crescente com o parqueamento de autocaravanas, um pouco por toda a Serra da Estrela. Esta realidade pareceu estar sob controlo durante décadas, mas, actualmente, e infelizmente para a Serra da Estrela, a circulação e estacionamento destes veículos entrou em roda livre. De forma adicional a este cenário descontrolado de viaturas espalhadas pela Serra, há-que salientar a postura dos cidadãos residentes que, indiferentes, permitem e coadunam com este espectáculo desrepeitador da natureza e que cada vez mais se instala numa das regiões montanhosas mais belas de Portugal. Estes, parecem desconhecer que com tal atitude estão alimentando problemas que os prejudica, não referindo sequer que se trata de uma ilegalidade fomentada pela passividade legislativa em Portugal.
Tenhamos em conta que pernoitar fora de locais apropriados para o efeito, em Portual, constitui acto ilegal. Naturalmente, os visitantes que nos procuram saem com, pelo menos, uma de duas impressões: Portugal é um país sem regras e onde não há obrigatoriedade de pagamento para pernoite em lugares específicos para tal. Possibilitar práticas incorrectas para o meio ambiente, através de descargas de cassetes do WC e outros resíduos inerentes à prática do caravanismo representa prejuízos graves para a economia da região e do país. No caso de estrangeiros, a vantagem é maior por não entrarem divisas.
Na verdade, para além da nossa fronteira, pernoitar fora dos locais destinados para o efeito, não tem a mínima possibilidade de ser praticado. Em Áreas Protegidas então, é impensável.
Torla, por exemplo, é uma aldeia, na zona Espanhola dos Pirinéus, com 335 habitantes. Nos meses do Verão, vê aumentada a população em 10 vezes mais os seus residentes habituais, mas apresenta uma excelente oferta de alojamentos e parques de campismo. Do nosso ponto de vista, o sistema presente nesta localidade, na Serra da Estrela, não iria funcionar, desde logo, porque as realidades são muito diferentes. (2) (3) Porém, parece haver algumas lições a retirar.
Para fazer face à procura e eliminar os acessos a veículos à Pradaria, no vale de Ordesa, foi construído um grande parque de estacionamento, na entrada da povoação, de onde partem os autocarros que, de 15 em 15 minutos, fazem o trajecto entre a povoação e a Pradaria, permitindo um máximo de 1.800 pessoas no seu interior. Atingido esse número, só sobem de acordo com as descidas. O parque de estacionamento gratuito foi construído para garantir o parqueamento de veículos, inclusive, autocaravanas, possibilitando aos seus donos apanhar os autocarros e distanciar o trânsito do centro, onde as dificuldades, pelo acidentado do terreno e características da urbe, são imensuravelmente mais complicadas que nas aldeias da Serra da Estrela. Ainda assim, fizeram-no, e muito bem conseguido. Os avisos afixados no local informam os transeuntes que a partir das 20 horas os proprietários das autocaravanas não podem dormir ali. Ou vão para um hotel e a autocaravana fica no estacionamento, ou terão de procurar outro tipo de alojamento. Dormir ali é que está fora de questão. A logística de funcionamento deste local é exemplar, um modelo a seguir.
Se a legislação actual em Portugal já impede que se aparque fora dos locais para o efeito, o que nos difere da realidade de Torla? Deixamos o convite para a reflexão.
Nos Picos da Europa, apesar da informação constar nos folhetos do Parque Nacional, os descuidos existem, mas os descuidados não podem levar avante a sua ignorância. Os guardas do Parque Natural dos Picos da Europa, tal como os de cá, conhecem a rigor os locais onde se procura pernoitar. Assim, encontrando os que tentam a pernoita desalojada, deixam um aviso, para a eventualidade dos seus donos não estarem no local, para que, mesmo assim, quando regressarem à viatura, saibam que não podem permanecer estacionados após o pôr-do-Sol e durante toda a noite. Quem não cumprir, fica a conhecer as consequências. O que nos difere da realidade dos Picos da Europa? Deixamos o convite para reflexão.
Exemplo de uma notificação nos Picos da Europa, Espanha.
Claro que há um problema de base que ninguém pensa resolver. Um dia, quando se chegar à conclusão que este modelo se esgotou e pouco mais há a fazer para recuperar o irrecuperável, talvez os resquícios por aí escondidos que a co-gestão não conseguiu aproveitar para comercializar, levem os demais a compreender os alertas que fomos colocando, insistindo, ainda que rumando a lado nenhum.
Fauna | 2025-05-07
Defesa ambiental | 2025-05-07
0 Comentários