Revista Zimbro
by Amigos da Serra da Estrela
 

2025-05-07

Carta Aberta sobre a Gestão Florestal da Serra da Lousã – 2025

Carta Aberta sobre a Gestão Florestal da Serra da Lousã – 2025

 

Palavras chave

carta  icnf  
 

A Carta Aberta que publicamos foi-nos enviada por um cidadão residente na região da Lousã. Preocupado com a situação dos cortes de madeira que se têm vindo a verificar, o mesmo endereçou-nos esta carta, na expectativa de que a ASE pudesse comungar dos seus valores de protecção e conservação da Natureza da sua área de residência. A situação dos cortes de madeira e da proliferação das acácias é uma realidade há muito conhecida pela nossa Associação (1), pelo que subscrevemos a carta que nos foi remetida, acreditando que as entidades responsáveis pela gestão da área florestal da Serra da Lousã tenham em consideração este clamor, que consideramos de uma profunda sinceridade e objectividade. A subscrição desta Carta Aberta é um gesto desproporcional à dimensão da necessidade de mudança da realidade na Serra da Lousã. Infelizmente, esta realidade não é exclusiva à Lousã, mas, pela importância de reconhecer situações como esta, a ASE pretende mostrar-se solidária com o conteúdo que se segue.

Carta Aberta

A Serra da Lousã é uma das mais relevantes áreas florestais públicas de Portugal, com um valor turístico de importância crescente. Trata-se de um território sob administração do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), entidade que, paradoxalmente, tem demonstrado uma incapacidade estrutural para corresponder às expectativas que o seu nome estabelece.

As florestas públicas da Serra da Lousã foram plantadas maioritariamente no início do século XX pelos extintos serviços florestais, com fins de exploração madeireira, segundo os princípios da engenharia florestal da época. Hoje, o verdadeiro valor destas florestas não reside na sua madeira, mas sim no seu potencial ecológico, paisagístico, recreativo e turístico.

O ICNF mostra-se incapaz de se adaptar a uma mudança de paradigma. Sob a retórica de uma gestão florestal sustentável, ao longo dos anos, têm sido promovidos cortes seletivos de árvores com várias décadas ou mesmo séculos de crescimento, desconsiderando a sua importância ecológica. O corte destas árvores, além de representar uma perda patrimonial irreversível, é economicamente míope. O seu valor ecológico, paisagístico e turístico é incalculável.

Mais grave ainda é a consequência ecológica direta e irreversível desta política de gestão florestal: a substituição contínua das espécies autóctones ou de elevado valor paisagístico e ecológico por acácias — uma espécie invasora agressiva, com elevada capacidade de dispersão e regeneração, que coloniza rapidamente as áreas intervencionadas.

Este fenómeno tem transformado rapidamente a paisagem da Serra da Lousã, resultando, em muitos locais, numa mancha homogénea de vegetação infestante, pobre em biodiversidade, ecologicamente degradada e desprovida de valor turístico.

Embora o ICNF não seja o único responsável pela transformação generalizada da paisagem, tem responsabilidade direta e ativa nas áreas sob a sua tutela, onde a propagação descontrolada das acácias poderia e deveria ter sido mitigada, através da proteção e conservação da floresta existente, em vez do seu corte seletivo.

Esta dinâmica ecológica — previsível, amplamente estudada e evitável — foi negligenciada.
A ausência de resposta proporcional à gravidade desta infestação, aliada à persistência de práticas que favorecem a expansão das acácias, revela inércia e uma incapacidade de adaptação às exigências ecológicas contemporâneas.

Em vez de conter o avanço das espécies invasoras, a chamada gestão florestal sustentável que é praticada — assente, entre outros aspetos, no corte seletivo de árvores — tem funcionado como um fator de aceleração da sua propagação, contribuindo para uma degradação ambiental de natureza irreversível.

A delapidação de um património natural desta relevância e a continuidade da atual abordagem sem uma estratégia integrada para a sua proteção e valorização comprometem o seu futuro.

Exige-se, por isso, uma reavaliação urgente da forma como são administrados os aproximadamente 55 mil hectares de Matas Nacionais, sob tutela do ICNF, pertencentes ao domínio privado do Estado, entre os quais a Serra da Lousã.

A retórica ambientalista, acompanhada de burocracia e inércia institucional, não basta. É necessária uma resposta aos desafios ecológicos do século XXI.

A floresta pública é um bem coletivo e um património de interesse nacional. Não pode continuar sujeita a uma gestão florestal inadequada às exigências atuais, que ignora o seu valor ecológico, paisagístico, turístico e cultural. Exige-se uma gestão pública moderna, democrática e transparente, orientada para a salvaguarda do futuro em prol do bem comum.

 

(1) https://youtu.be/01z80ztyEN0?si=knySI63q5IszjpTK

 
 

 
 
 
 

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