by Amigos da Serra da Estrela
2023-12-06
Palavras chave
faias massificação trilhos turismoUsufruir da natureza, observar a biodiversidade, sentir os sons do bosque e procurar a paz que as envolventes cores do Outono nos dão. Tudo isto é procurado pelo verdadeiro caminhante e, até há poucos anos, era o que as (recentemente redenominadas) Faias de São Lourenço (eu prefiro continuar a chamar-lhe serra de São Lourenço) ofereciam.
Subi até São Lourenço para fazer este trilho. Fiquei chocado com o que vi.
No pequeno largo da Cruz das Jogadas, hoje transformado em grande estacionamento, havia carros por todo o lado. Houve quem tivesse contado 200 viaturas (entre ligeiros e autocarros). O trilho que segue para o Campo Romão servia de estacionamento.
Iniciamos a caminhada e, depois de desvios entre pessoas que terminavam e iniciavam o percurso, lá seguimos. Mais à frente, uma retroescavadora que arranjava o caminho e um pequeno riacho de escoamento de águas pluviais, dos estragos do último incêndio, teve de parar de trabalhar uns bons 10 minutos, tal era o número de transeuntes, não fosse magoar alguém.
Durante o trajecto cruzamo-nos, para além da multidão, com bicicletas a toda a velocidade, motas e jipes. A quantidade de pessoas era de tal forma que, em alguns troços, não fosse estarmos no meio da floresta, confundia-se com as ruas de uma qualquer baixa comercial. Juntando-se a toda esta azáfama, a meio da rota um violinista, com música aos berros como se estivesse numa praça central de uma cidade.
Fiz um dos trilhos com menor afluência, ou nenhuma, e como é óbvio não vou revelar qual, alguém que ía comigo teve a oportunidade de ver pela primeira vez javalis e esquilos no seu estado mais selvagem e natural. Nas Faias não é possível ver nada disto.
O turismo em geral, mas principalmente o de natureza, é uma das grandes forças económicas nos países do norte da Europa e, de há uns anos para cá, Portugal procura fazer o mesmo, desenvolvendo-o, mas de uma forma desenfreada, e este não é o melhor caminho.
Com o aumento do turismo pretende-se, como é lógico, um aumento do benefício económico, mas será mesmo isso que está a acontecer em Manteigas? Na vila o movimento não reflete a enchente na Rota das Faias. Porque acontece isto? O turismo desgovernado não traz riqueza para nenhuma região, quem faz o trilho das faias (e outros) não deixa nada em Manteigas, leva o farnel e almoça a meio do percurso. Depois, saem da Serra, passam pelas Penhas Douradas, pela Torre ou Penhas da Saúde para ver de passagem o que vem nas redes sociais sobre a Estrela. O importante é tirar meia dúzia de fotografias para publicar. Por fim, seguem para as suas terras ou acabam por ficam por Seia, Gouveia ou Covilhã. Na época de neve acontece o mesmo.
É esta a qualidade de turismo que queremos? São estas as Faias que queremos que fiquem na memória? se calhar não…
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Podemos adorar as cores das faias. Isso é lindo e agradecemos aos silvicultores por essa floresta. Mas não podemos esquecer que a faia não é nativa de Portugal. Os silvicultores deram uma mão amiga. A verdadeira biodiversidade não está nas florestas de faias de Manteigas, mas nas florestas autóctones. Não esqueçamos isto: não deixem que os políticos chamem tanta atenção para as florestas de faias, porque isso mostra o que vocês realmente consideram importante: não a própria natureza espontânea que viveu em liberdade ou em ligação com os agricultores durante séculos, mas que você aprecia a natureza construída considera mais importante. É uma pena que o município e até o geoparque participem nesta falsa propaganda e não se concentrem na sua responsabilidade de dar a conhecer a verdadeira biodiversidade da Estrela.
Caro Jan,
Como acompanha o trabalho do Geopark há anos, desde o dossier de candidatura e participando no Conselho Científico sempre que convocado, conhece a nossa preocupação com o rigor científico nas nossas atividades, bem como com a sustentabilidade.
Tenha a certeza de que, quando estamos a fazer a interpretação da rota das faias, não estamos a exaltar o sítio como um ex-libris da biodiversidade da Estrela, mas numa abordagem histórica de valorização do trabalho dos serviços florestais, considerando o contexto em intervieram no território. Sempre reforçamos, nestas atividades, os conceitos “espécie autóctone” e “espécie exótica”.
E, assim, aproveitamos este interesse do público nas cores “instagramáveis” das faias no outono, que os atrai à serra da Estrela, para contar sobre os reais valores naturais do território, para além da sua história de ocupação humana.
Sobre o mencionado no texto do Paulo Silva, que “Na vila o movimento não reflete a enchente na Rota das Faias”, esta é uma inverdade. A grande maioria das nossas inscrições foram de pessoas de fora do território, e foram incontáveis as vezes em que nos reportaram que não encontravam restaurantes para almoçar, tão cheias estavam as opções de restauração em Manteigas.
E é importante referir ainda que a Rota das Faias recebeu vários outros passeios organizados de empresas de fora do território, em iniciativa independente do evento organizado pela Câmara e o Geopark.
Obviamente, também nos preocupa a afluência de tantas pessoas a este sítio num período tão concentrado. E já temos falado nos ajustes a fazer para o ano, numa autoavaliação que sempre fazemos.
Mas, na minha opinião pessoal, antes uma visitação mais intensa às Faias, área de menor vulnerabilidade ambiental e próxima aos estabelecimentos que podem tirar proveito económico deste fluxo, em que haja a oportunidade para a sensibilização ambiental como fazemos, do que a realidade do mês de Novembro há cinco anos, quando a economia em Manteigas praticamente parava, e ficava apenas à espera do primeiro nevão. A sustentabilidade também passa por isso.
Seguimos sempre disponíveis para colaborar, ouvir as preocupações da população e trabalhar pelo território.
Um abraço
Caro Lucas Cezar
O obcjetivo deste tipo de artigos serve, pelo menos para mim, para abanar consciências e principalmente que haja reflexão e mudança.
Tal como diz, e a imagem fala por si, preocupa-o a afluência de tantas pessoas e têm “falado nos ajustes a fazer para o ano”. Pois penso que será mesmo esse o melhor caminho.
Quanto à “inverdade” não vale a pena comentar!
Ao seu dispor.
Caro Lucas Cezar,
Para começar, é muito bom que se esteja a dar atenção à Estrela. Também é bom que haja divulgação e discussão sobre a área. Isso faz-me muito feliz. Eu ficava feliz porque tinha uma revista que falava de todo tipo de coisa que acontecia na Serra. A revista chamava-se Estrela, bolletim informação e era editada pela PNSE. Naquela época, o parque natural preocupava-se com quase tudo o que era importante para dar individualidade e significado ao espaço. De repente, a revista desapareceu. Não vou aprofundar este assunto, mas gostaria de salientar que houve menos abertura. E como em qualquer casamento, menos abertura é o começo do fim. Culpo as autoridades por isso.
No verão passado estive na Estrela com um grupo de naturalistas holandeses. Em breve publicarei o relatório no site Estrela Facebook, que fundei há mais de 11 anos.
As pessoas acharam lindo e não fomos de jeito nenhum ao bosque de faias, queríamos ver muita coisa, mas fomos impedidos porque a estrada de subida estava fechada. no entanto, as pessoas permaneceram calmas, apesar de em muitos dias termos perdido até 3 horas de cada vez devido ao desvio de estrada que foi resultado de uma má gestão: os incêndios florestais. Mesmo assim, pagaram o preço total da viagem, como se a estrada estivesse aberta ao trânsito que nos foi prometido.
Foi a segunda vez que organizei isto e reparei que muitos idosos dos Países Baixos estão interessados, mas não nas faias e nem nas dolorosas marcas de queimaduras. Eles não trazem muito dinheiro, mas trazem um fluxo constante e não são pobres e no futuro os idosos tornar-se-ão cada vez mais numerosos e deixarão muito dinheiro para a população local porque estão interessados no local detalhes. Não são turistas de massa… não vêm para esquiar ou caçar, mas para desfrutar da enorme biodiversidade que se torna cada vez mais difícil de encontrar. Não vou entrar mais nisso agora. o povo ficou muito chocado com aqueles passadicos de Videmonte. Não é normal. Havia centenas de carros à entrada e na aldeia de Videmonte onde queríamos tomar café não havia lugar para estacionar. É assim que você assusta esse tipo de gente, e eu também. Não acho que isso seja inteligente, mas entendo os economistas e os investidores. Está claro que algo não está dando certo. É a tragédia que se pode ver em toda a Europa. Os ricos estão cada vez mais ricos, os pobres estão cada vez mais pobres e a natureza está cada vez mais pobre. Deveríamos ficar bem com isso? Queremos fazer algo a respeito? Essa é uma decisão política. Atenciosamente, Jan Jansen
Infelizmente vivemos num tempo e numa sociedade em que a quantidade é sinónimo de sucesso em detrimento da qualidade. Infelizmente pessoas como o Paulo, que procuram e valorizam mais o silêncio e a experiência sensorial são uma minoria e não interessam aos manda-chuvas do turismo porque se calhar tal como eu não vão usar as redes sociais para promover os seus espaços ou os seus hotéis. E é aqui que reside a preversidade do turismo que acaba quase por criar uma seleção natural de quem usufrui dos espaços. Eu sou do Fundão, mas tenho uma ligação muito especial com esta serra desde a minha infância e posso dizer que cada vez vou lá menos porque cada vez é mais difícil poder usufruir da mesma com alguma paz. Talvez fosse interessante fazerem um estudo sobre de que forma esta massificação do turismo está a afectar os habitantes locais na forma como se relacionam com o território onde nasceram e cresceram e de que forma é que isto mudou os seus hábitos e comportamentos sobre esse mesmo espaço, porque senão corremos o risco de simplesmente estarmos a vender o território, a troco de muito pouco diria eu, porque o turista não impede uma mercearia, um centro de saúde, uma escola, um sapateiro, etc de fecharem, aquilo que dá verdadeiramente vida a um lugar.
Este artigo e os comentários que se seguiram suscitam-nos a seguinte reflexão:
É interessante e importante que o período do Outono tenha despertado a atenção dos autarcas locais. A publicidade já vinha a verificar-se timidamente, mas foi no actual mandato que se verificou uma aposta mais forte.
A ASE já tinha escrito, por mais de uma vez, que era importante apostar nesta época, por se tratar de uma das mais interessantes alturas do ano, do ponto de vista turístico, e, ao mesmo tempo, das mais baixas taxas de frequência de visitantes à Serra da Estrela. Esta proposta seria, claro, em detrimento da aposta constante noutras épocas sazonais, em que se continua a gastar energia e verbas, fruto do “vício” imposto pela Comunicação Social.
Contudo, uma coisa é promover um pequeno bosque de faias, outra é criar um conjunto de condições que suportem o número de visitantes, sem que os mesmos se atropelem mutuamente aquando dessa visita. Mais se acrescenta que o município beneficiaria, se fossem criadas alternativas, bem mais motivadoras, isto é, sem que os visitantes fossem obrigados a conviver com as bicicletas, motas, jeeps e, ainda, a moda que se tem vindo a instalar dos conjuntos musicais em locais que se deveriam remeter a um ambiente que fosse resguardado.
“O Turismo Sustentável em espaços naturais ✅, é a única forma de cumprir os preceitos das Instâncias máximas de Proteção da Natureza Mundial, Nacional, Regional e Local.
Com tantas instâncias presentes no nosso território, toda a sua legislação falhou, todos os planos de prevenção falharam e a grande maioria das pontes institucionais, que restavam com as populações falharam.
Há Santuários Naturais que estão a ser propositadamente expostos para uma presença humana. Portanto, com critérios racionais e tangíveis, há políticas turísticas públicas balizadas na visitação do espaço. O que está a faltar? A maior coordenação e o maior controlo da presença abusiva de visitação destes espaços.
É mandatório e urgente, descarregar a elevada carga turística em outros vértices do nosso Turismo de Montanha sob pena de sobrecarregar uma área geográfica, à sua interdição no médio prazo. Será que era porreiro promover a subida ao Cântaro Magro? Era, mas a lei defendeu-o e tornou-se bloqueadora dessa iniciativa. Infelizmente, sem se perceber a validação desta medida, a lei tem estado a ser aplicada mas sabemos que proibir “per si” não é garantia de proteger e salvaguardar. O ideal, é a lei sempre se harmonizar com a utilização sustentável do espaço de visitação. O que no Cântaro Magro deixou de acontecer apenas pela lei sem, alguma vez ter estado em causa até hoje, a perda significativa, parcial ou extinção do que se tenta proteger.
Na fronteira última legal, teremos de exigir o mesmo ao território das Faias? Espero que não se vislumbre essa situação nem se preveja esse horizonte. Seria o retumbante chumbo de que o que está ali a ser promovido, nunca previu a sustentabilidade e colocou em risco, a área dita Faias.
Haja coragem, imponham-se comportamentos e “modus operandis” em equilíbrio com os espaços Naturais que recebem os Turistas.
Impõe-se uma visitação à Natureza no nosso Concelho com responsabilidades partilhadas. Sim, não temos outra forma de o fazer ou perderemos por culpa própria, o pouco que ainda nos restou dos incêndios.
NOTA: Reforcei a legítima alusão ao Cântaro Magro, para mostrar que as medidas proibitivas existem e não devem ser aplicadas, replicadas ou assumidas como regra, para Proteção de habitats de fauna e flora.”
Quanto a mim, a massificação da Rota das Faias está completamente errada. Quanto aos benefícios económicos estão por demonstrar. As filas nos restaurantes já aconteciam em anos anteriores. Este ano chegou a estar marcado um concerto dos Capitão Fausto que só foi cancelado por previsão de mau tempo. Nem percebo coo o Parque Natural autoriza esses eventos e, muito menos, como o Geopark é parte da organização que leva milhares de pessoas a um lugar cheio de vida selvagem.